sexta-feira, 18 de abril de 2014

KARMA YOGA NA VIDA DIÁRIA

Karma Yoga na vida diária
Swami Niranjanananda Saraswati


O Yoga sempre foi relacionado a uma série de práticas para ser realizada longe das situações da vida social normal – em um ambiente de sala de aula ou em um retiro na companhia de "seres espirituais". Nós pensamos que, se praticarmos esta ou aquela técnica de Yoga, vamos alcançar este ou aquele resultado. O que temos feito é transformar o Yoga em um processo mecânico que conduz à autoconsciência. Temos de afastar essa ideia e fazer do Yoga uma parte da nossa expressão natural. Só então, o Yoga tornar-se-á um processo que conduz à autorrealização.
Se praticarmos Yoga como uma técnica para nos sentir bem, então vamos, definitivamente, nos sentir bem por um tempo. Se praticarmos Yoga, a fim de relaxar, então vamos definitivamente relaxar. Se praticarmos Yoga para conectarmo-nos com nós mesmos internamente, então isso também se tornará possível. Mas qualquer que seja o interesse da prática, este será momentâneo, uma fase transitória, e, quando tivermos que enfrentar de novo a realidade, tensões e frustrações da vida, então o efeito do Yoga ficará em segundo plano. Portanto, é preciso que se entenda que a experiência real do Yoga acontece através de Karma Yoga. Mesmo se você praticar Hatha Yoga, Raja Yoga, Kundalini Yoga ou Kriya Yoga você tem que combinar a técnica escolhida com Karma Yoga, a fim de ter uma rica experiência do processo.
Algumas pessoas têm a ideia de que Karma Yoga não tem nenhuma relevância em suas vidas, que é apenas trabalho duro. Alguns pensam que Karma Yoga é apenas serviço ao Guru, à Deus ou à humanidade. Outros pensam em Karma Yoga como serviço altruísta ou ação altruísta. Nenhuma destas definições representa o verdadeiro espírito do Karma Yoga, porque o Karma é uma parte integrante da nossa personalidade e da vida. As pessoas têm traduzido Karma como ação. Alguns têm definido Karma como causa e efeito. Nenhuma dessas definições é verdadeira. Você tem que entender que tudo na vida é Karma e se você evitar o Karma, então você não existe.

Expressão da natureza do Karma
A Natureza expressa o Karma através dos elementos. O calor do fogo é o Karma do fogo. A expansividade do espaço é o Karma do espaço. O movimento do vento é o Karma do ar. A natureza líquida da água é o Karma da água. A solidez da terra é o Karma do solo. Desejos, expectativas e pensamentos são Karmas da mente. As expressões dos sentidos são Karmas do corpo. Na verdade, somos Karma homogêneo. O mundo inteiro é Karma homogêneo, toda a criação é Karma homogêneo.
Entenda que Karma não é apenas causa e efeito, não é só a ação. Karma é um movimento de ondulação do tipo sutil que afeta todas as dimensões da criação. Karma é o movimento que acontece no corpo, através dos sentidos e na mente, através das projeções mentais e experiências. Se você pratica Asana (posições físicas), você está alterando o Karma do corpo. Se você pratica Pranayama (técnicas de respiração), você está alterando o Karma de vitalidade e do cérebro. Se você pratica a meditação, você está alterando o Karma da mente sutil e do espírito. Esta é a maneira de gerenciar os Karmas que nos influenciam tanto de forma positiva, como de forma negativa. Karma é a consciência do movimento da vida. Não é trabalho árduo, não é serviço, não é causa e efeito, é a compreensão de como nos relacionamos com nós mesmos e com o nosso ambiente.
No terceiro capítulo do Bhagavad Gita, Krishna afirma que o tema do Karma Yoga nunca foi compreendido. Ele disse isso há 5.000 anos e hoje ainda é válido, porque Karma Yoga é um assunto que envolve a compreensão da natureza humana, que envolve o desenvolvimento da consciência total da personalidade. É um processo de observação do nosso movimento na vida, do grosseiro ao sutil, para o espiritual.

Tornar-se consciente

cinco componentes do Karma Yoga. O primeiro componente é a consciência. Tornar-se consciente começa com o corpo, quando praticamos Asana. A consciência torna-se parte da prática de Asana e do movimento físico. Se você tem que mover um dedo, você está ciente do movimento do dedo, e também da força dos músculos e do movimento das articulações. A consciência emergente disseca o dedo em ossos, músculos e nervos. Os músculos e os ossos se movem de forma diferente, os nervos e ligamentos puxam de forma diferente e a consciência continua a se tornar mais aguda, mais sutil. O que você observou antes é uma experiência, mais tarde, você vê isso em seus diversos componentes e formas. O objetivo do Asana é torná-lo consciente de seu corpo e de como ele se expressa em situações normais. Consciência no Asana levará a conforto e estabilidade.
Nos Yoga Sutras, Patanjali define Asana como uma postura em que você se sente confortável e estável. Você está sentado aqui durante os últimos vinte minutos. Você está estável e confortável? Alguns de vocês sim, outros não, e aqueles que estão confortáveis agora, ficarão desconfortáveis depois de dez minutos. No momento, não estamos conectados com o corpo. Nós sentamos, mas não temos consciência do sentar. Caminhamos, mas não temos consciência de andar. Nós movemos nosso corpo, mas não temos consciência do movimento do corpo. O propósito do Asana é levá-lo a um estado de conforto e estabilidade. O reconhecimento do conforto e da estabilidade, só virá quando você se tornar consciente.

Observando-se a reação
O segundo componente do Karma Yoga é mental, observando suas reações e comportamento interior. Alguém diz: "você é muito bonito e uma pessoa grande e maravilhosa". Um outro lhe diz: "você está sem esperança". Estas afirmações afetam sua sensibilidade e criam uma reação. Essa reação domina seus preconceitos, crenças e idéias. Você se sente eufórico ou deprimido. Seu estado de espírito se modifica. Uma única frase tem força para alterar seu humor. O primeiro componente do Karma Yoga é estar consciente, o segundo é observar sua reação.
Patanjali enuncia no terceiro Sutra: "O 'vidente' se estabelece em sua própria natureza". Quem é este vidente, o observador? Qual é o papel desse observador ou vidente? No primeiro estágio, o vidente tem a experiência; é como a pessoa está respondendo e reagindo a pessoas, situações e circunstâncias. Este é um dos objetivos da meditação também. Através da experiência da meditação e de observar as mudanças no humor, consciência e mente. Quando estamos conscientes das expressões mentais que se manifestam, então somos capazes de dirigir e guiar nossas expressões mentais. Mesmo a meditação torna-se um processo de realização do movimento mental, psicológico, sutil, emocional ou Karma.

Desenvolvendo imunidade

O terceiro componente é o desenvolvimento de imunidade contra as coisas que o afetam. Como você desenvolve imunidade de situações ou influências? Ao sair das percepções egocêntricas nas quais outras pessoas ou objetos não existem e só você é o centro e o foco de sua vida. Quando você é capaz de ir além da consciência egocêntrica, auto-centrada, então você começa a desenvolver imunidade a situações, eventos e idéias.


Gerenciando a expressão emocional
O quarto componente do Karma Yoga é liberar os bloqueios emocionais. Emoções são muito escorregadias. Intelecto é um caminho em linha reta, um caminho linear. Por meio da lógica, você pode ir do ponto "A" ao ponto "B" ao ponto "C" ao ponto "D", uma rota contínua, até o fim. Lógica ou intelecto é um caminho em linha reta horizontal, mas as emoções são um caminho inclinado, pelo menos, 45 graus. É difícil subir, mas fácil deslizar. É difícil desenvolver uma identidade emocional positiva e feliz, e é muito fácil cair ou escorregar para as emoções negativas. Nunca nos ensinaram a odiar ou como ficar com raiva ou inveja ou agressivo. Isso vem naturalmente. Mas quando tentamos ensinar como amar, como ser compassivo e positivo isso não vem naturalmente. Portanto, as emoções são um caminho inclinado; nós deslizamos a maior parte do tempo e subir é uma grande luta e uma longa jornada.
Tornar-se consciente de como você é capaz de gerenciar suas expressões emocionais é o quarto componente. Você é capaz de manter-se sereno tanto no sucesso como no fracasso? Se você pode fazê-lo, você terá uma personalidade muito equilibrada. No entanto, você precisa ter confiança, fé e crença em si mesmo e, ao mesmo tempo, precisa acreditar ou ter fé e confiança em alguma natureza cósmica superior que orienta a sua vida.


O melhor exemplo é o agricultor. O agricultor planta as sementes e cuida do crescimento das plantas, na esperança de que um dia o que ele plantou vai dar bons resultados na forma de frutas e grãos. Mas não há tanta coisa que o agricultor possa fazer. Além disso, ele tem que esperar pela graça divina e que o clima seja o correto. A chuva deve cair no momento certo. O sol deve brilhar no momento certo. Existe um limite para o esforço humano. Depois, há o surgimento da graça divina. Se o ambiente não está certo, todos os esforços do agricultor serão desperdiçados, e, se houver muita graça divina na forma de chuva, também pode ocorrer à inundação de toda a fazenda. Então, até certo ponto, é preciso ter essa crença, confiança e fé em si mesmo e, além deste ponto, você precisa ter fé, confiança e acreditar na força cósmica. Tem que haver um equilíbrio adequado entre a confiança que você coloca em si mesmo e a confiança que você coloca na força cósmica. Esta harmonia de confiança é conhecida como Karma Yoga das emoções.

Deixando de lado as obsessões
O quinto componente do Karma Yoga é deixar que as pendências pessoais se vão, deixando de lado as obsessões que criamos dentro de nós mesmos. Isto é conhecido como sinal de rendição. Não pense em rendição em termos de definições filosóficas ou religiosas, mas como suplantar e liberar-se das obsessões, e tornar-se livre. No momento em que você é capaz de abrir mão de suas obsessões, você se torna criativo. Nossas obsessões não permitem que a natureza criativa venha à tona. Criatividade não significa apenas a expressão artística. Criatividade significa mente e emoções em plena floração. Esta criatividade é alcançada quando somos capazes de liberar nossas obsessões e complexos. A próxima etapa, então, se transforma em ação altruísta, que é espontânea e natural. Para algo tornar-se altruísta, não há nenhum desejo, nenhuma ligação, nenhuma associação com o que está acontecendo. Caso contrário, todos nós tentamos converter água em vinho na primeira chance que temos. Não porque isso nos ajuda de alguma forma, mas porque aumenta nosso ego. A natureza egoísta é geralmente a predominante. Tornar-se altruísta é uma das coisas mais difíceis na vida.


Uma vez Deus decidiu dar uma bênção para um santo que tinha feito um monte de penitências. Mas o santo não desejava nada mais na vida, uma vez que tinha visto Deus e se recusou a aceitar qualquer coisa. Então, Deus deu a benção da paz, prosperidade e saúde para a sombra do santo. O santo não sabia sobre a dádiva, mas, onde quer que fosse, havia paz, prosperidade e saúde. Isso é um ato altruísta.
O serviço abnegado, o ato altruísta, é o ponto final e culminante do Karma Yoga. Se você associar Karma Yoga com os outros Yogas, então você vai ver a sua relevância. Hatha Yoga sem Karma Yoga não tem sentido. Você também tem que estar ciente de que não estamos falando de Karma, mas sobre Karma Yoga. Quando a palavra Yoga é adicionada à Karma, significa harmonia em todos os movimentos da vida, harmonia em todas as expressões do corpo, mente e emoções. Este é o conceito de Karma Yoga – internalizar a consciência, tornando-se consciente e libertando-se de obsessões e da negatividade.
É claro que temos que começar com algo tangível e reconhecível, e isso é o nosso corpo, que carregamos desde o momento de nosso nascimento até a hora de nossa morte. Assim, em Hatha Yoga e Raja Yoga, a associação com Karma Yoga leva-nos  a aprofundar a consciência. Em relação à Bhakti Yoga, Karma Yoga leva a equilíbrio das emoções. Em relação ao intelecto e Jnana Yoga, Karma Yoga leva a um maior conhecimento, percepção, observação e sabedoria. Como um ser perfeito caminha, come, vive, dorme? Pense nisso. Mesmo em Kriya Yoga e Kundalini Yoga, Karma Yoga tem de ser adicionada. A experiência que você tem com o despertar das forças sutis, as energias sutis, os centros psíquicos, tem que ser harmonizada, deixando de lado as tendências negativas e atrações desses centros.
Como podemos começar a compreender e incorporar Karma Yoga em nossas vidas? Mudando nossas atitudes e percepções através das práticas e sistemas de Yoga.

Satsanga realizado em Barcelona, Espanha, 18 mai 2001.
Fonte: http://www.yogamag.net/

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...